sábado, 23 de outubro de 2010

Díade Mãe-Filho em São Tomé



A Mulher

Impressiona qualquer um a Mulher santomense: carrega alguidares de roupa durante quilômetros até ao rio, sem nunca perder o equilíbrio, e geralmente tem o peso adicional do bebé, que transporta sempre às costas, enfaixado em panos de cores garridas. Se marco uma consulta, e quando consigo que a mãe entenda o quão importante é não faltar, fazem 10 ou mais quilômetros a pé, depois de se levantarem de madrugada, e chegam ao serviço do hospital ainda antes de mim.


A taxa de natalidade da Ilha é das maiores do mundo, e a primeira gravidez ocorre em idade muito jovem, quase invariavelmente; não é raro encontrar mulheres que, com a mesma idade que em Portugal se inicia o estudo universitário, têm já um ou dois filhos.

Acresce que, mercê da cultura do pais, a mulher santomense se ocupa de tudo o que diz respeito à vida familiar, sem nenhuma actividade que lhe garanta sustento próprio e, pelo paradigma contemporâneo do Ocidente-Norte, a independência.

No que respeita à vivência familiar, essa dedicação a tempo inteiro constitui, em regra, o único elemento de constância relacional para a criança; observo também a carência de instituições comunitárias, como creches, escolas e parques infantis, capazes de garantir o estímulo complementar para o desenvolvimento integral da criança santomense. Esse desenvolvimento passa, então, por estas mães e pelo que são capazes de fazer enquanto desempenham esse papel.



A Criança

Mal nascem, independentemente do peso, são transportados às costas das mães, e começam a deambular muito cedo (alguns com 9 meses já dão os primeiros passos decididos). Em contraste com o excelente desenvolvimento motor, muitas crianças são muito pouco verbais, e é mesmo difícil conseguir que digam o nome ou a idade até depois dos 3 anos. Durante as consultas a maioria é calma, curiosa e as birras e as exigências perante os pais são raras. Crescem livremente, saudáveis ou doentes. Quando têm idade para ir à escola, andam quilômetros na berma da estrada para receberem a lição, sem medo, sozinhas.


A maioria não tem o leite, a carne ou o ovo como parte da sua alimentação. No contexto actual, o lúdico e a protecção da criança ainda não são valores firmemente assentes no quotidiano santomense.



Operação Nariz Vermelho no Hospital Ayres de Menezes

Com muito agrado, recebi a proposta de colaborar, participando, na primeira Operação Nariz Vermelho realizada no pais. A ONG T.I.A., representada pela Drª Mafalda Velez Horta, jurista de formação, e a viver na ilha há mais de dois anos, foi a entidade responsável pela organização e logística do evento.

A proposta nasceu de um encontro de sensibilidades sobre a necessidade de estimular as crianças internadas trazendo-as até um tempo de brincadeira pensado para elas.





Na iniciativa participaram voluntários santomenses e portugueses.





Surpreendidas de início...



Rendidas pouco depois...






O lúdico é ainda o recipiente ideal para passar mensagens, dentro de um processo de apropriação cultural.




O transporte da criança em posição lateral potencia os momentos de interacção mãe-filho, rosto com rosto, modelando afectos, linguagem e competências sociais em mãe e filho.

A ambição maior deste projecto é não ser um evento extraordinário, mas antes, repetindo-se, entrar na rotina hospitalar e nos hábitos da comunidade.

Abraço e até próximo post.







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