quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Cáritas de São Tomé e Príncipe


Hoje, após uns dias de altos e baixos passados no hospital, quero falar-vos de uma situação que me tocou particularmente. Durante a nossa primeira semana em STP visitámos a Cáritas e para todos foi uma experiência muito emotiva. Esta instituição, que funciona como um orfanato, acolhe crianças até aos 6 anos, orfãs ou abandonadas pelos pais, todas com percursos de vida muito complicados. Algumas voluntárias (insuficientes) trabalham diariamente para dar os melhores cuidados possíveis a estes meninos, mas as dificuldades são muitas e se, a falta de pessoal é a que imediatamente chama a atenção, existem muitas outras que passam pela escassez de medicamentos, de leites ou de equipamentos básicos.

O que me marcou mais profundamente foi a situação de carência afectiva destas crianças que passam a maior parte do tempo num ambiente muito pouco estimulante, em espaços sobreaquecidos, desprovidos de qualquer decoração e com pouca atenção por haver tão poucos colaboradores para tantas crianças (23 nesta data).

Confrontado com esta realidade não pude deixar de me sentir tentado a ajudar e, logo a partir dos primeiros dias, tentei recrutar o maior número de pessoas que me pudessem ajudar a melhorar as condições (in)existentes. Até agora, desde professores a artistas, todos têm revelado um enorme entusiasmo e espero brevemente poder começar a dar-vos conta dos nossos trabalhos. Alguns dos objectivos propostos até agora incluem pintar e decorar os espaços da instituição, criar ementas que permitam melhorar a alimentação, conseguir medicamentos e alguns equipamentos, mas acima de tudo, levar mais pessoas a partilharem o seu tempo com estas crianças.

Vamos dar uma nova cara a este local e tornar estas crianças mais felizes!

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Mais acostumado ao modus operandi do hospital, mas ainda com sérias dificuldades na habituação ao trabalho permanentemente banhado em súor, sinto que o balanço de hoje foi muito positivo.
Durante as próximas semanas ficarei responsável por algumas camas de uma das enfermarias da Pediatria e começa a tornar-se mais claro o tipo de patologias com que lidarei durante a minha estadia. Hoje foi também dia de Banco de Urgência e, se a maioria das situações se tratam de doenças diarreicas e de infecções respiratórias a que estamos bastante habituados no nosso país, outras situações como casos de paludismo ou de desnutrição graves constituirão um grande desafio às minhas competências! Ainda para mais quando, como vos disse anteriormente, não há água no hospital e os recursos técnicos são praticamente inexistentes. Essa parece-me que será a principal dificuldade com que terei de lidar durante a minha estadia. Enfrentar a frustração de não ser, em algumas situações, capaz de evitar um desfecho trágico, apenas por falta de meios.
Uma grande ajuda é o final do dia no Café & Companhia (de onde vos escrevo) onde se reunem muitas das pessoas que participam nas diversas cooperações e partilham as suas experiências nesta terra com tantos problemas.

Aproveito este post para enviar cumprimentos aos meus colegas que iniciaram hoje as suas provas de conclusão do internato e brevemente serão brilhantes Pediatras. A todos, MUITO BOA SORTE!

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Nutrição Pediátrica em STP

Um dos projectos que o Serviço de Pediatria do São João vai levar a cabo, em colaboração com o Hospital Ayres de Menezes e com os Serviços de Saúde Primários de STP, consiste na caracterização do estado nutricional das crianças deste país. Esta avaliação irá decorrer ao longo deste ano e vai incluir crianças do 0 aos 5 anos. Tem como principais objectivos diagnosticar situações de malnutrição, identificar crianças em risco nutricional e permitir o desenvolvimento de programas alimentares adequados à realidade local.

É bem conhecida a importância de uma alimentação saudável para um crescimento e desenvolvimento adequados e, a longo prazo, espera-se que a realização deste trabalho possa servir para melhorar os indicadores de saúde do arquipélago.

O primeiro passo já foi dado, com a realização de um estudo piloto que teve lugar durante esta semana e que teve como objectivo a validação do questionário a ser aplicado futuramente. Foram constituídas as equipas de profissionais de saúde que irão conduzir o estudo, houve formação teórica e prática, e no final, foi um grande sucesso! :-)

Aproveito este post para enviar os meus cumprimentos à Drª Diana Silva, que coordenou esta semana de trabalhos da Nutrição Pediátrica e regressou hoje a Portugal. Com ela seguiram também duas crianças que irão receber tratamento no nosso hospital e de quem esperamos boas notícias em breve.


A equipa da Nutrição Pediátrica, o Director do Posto de Saúde de Água Grande e eu próprio :-)

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Carnaval

Debaixo de um calor sufocante, que uma vez mais me deixou encharcado em suor, uma multidão concentrou-se junto ao Parque Popular para festejar o Carnaval. Ao ritmo de sons africanos e brasileiros, houve desfiles de grupos coreografados e muita dança por entre quem assistia. Uma grande festa!!!
Este grupo, fortemente armado, manteve a ordem e a segurança de todos que por lá passaram. :-)

O Hospital


Vista exterior de uma das enfermarias de Pediatria

Ontem iniciei finalmente a minha actividade no Hospital Central Ayres de Menezes, a instituição de referência no país. Situado no topo da pirâmide dos cuidados de saúde, garante assistência diferenciada nas valências de Medicina, Cirurgia, Pediatria, Perinatologia, Urgência e Cuidados Intensivos. Conta com o apoio de um Laboratório de Análises Clínicas, um departamento de Imagiologia, um Banco de Sangue, um serviço de Fisioterapia, uma Unidade de Endoscopia e uma Farmácia que, pelo que pude ver, muito beneficiaram da cooperação com numerosos países, entre os quais Portugal, EUA, Cuba e Taiwan. Os distintivos a assinalarem estes projectos de cooperação estão por toda a parte, mas a utilização de forma sustentada dos recursos tecnológicos existentes torna-se muito difícil quando as falhas de energia são constantes e o hospital não dispõe, actualmente, de água corrente. Resultado: enfermarias sobre-lotadas, quentes e mal ventiladas associadas a múltiplas restrições na realização de exames auxiliares de diagnóstico. Uma realidade muito diferente daquela a que nos habituámos nas Faculdades de Medicina e nos hospitais do nosso país!



Vista interior da mesma enfermaria

Mas nem tudo é mau! Ao longo destes dias tive a possibilidade de contactar com profissionais muito empenhados que, tentando utilizar da melhor forma possível os escassos recursos de que dispõem, se mostram tão generosos e se dedicam diariamente de corpo e alma, centrando sempre a sua atenção nos doentes.

Sinto que tenho muito a aprender neste mundo tão diferente daquele de onde vim e cada dia que passa me vejo renovado de energia para enfrentar os desafios e atingir os objectivos a que nos propusemos.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Visita a S. João dos Angolares

Entrega de equipamentos do FCP a uma equipa local. Tivemos direito a jogo com público e jogadores em êxtase! :-)





Eu, o Joãozinho e o Diogo

Casa do São João Em São Tomé e Príncipe


Esta é a mansão que servirá de quartel general do São João em STP.

A inauguração, coberta pela imprensa nacional, contou com a presença de numerosas individualidades, nomeadamente representantes do Governo e dos Serviços de Saúde da RDSTP e do Sr. Embaixador de Portugal.

Panorama fora da cidade


Ver para crer

Olá a todos!
O meu nome é Ricardo Bianchi. Com 31 anos e a concluir a especialidade de Pediatria no Hospital de São João, foi-me dada uma oportunidade privilegiada de concretizar uma ambição antiga: participar, como médico, num projecto de cariz humanitário, no estrangeiro. Ao fim de alguns meses de preparação, aqui estou, na República Democrática de São Tomé e Príncipe, para dar início a uma colaboração que pretende aperfeiçoar a qualidade dos serviços de saúde pediátricos, de forma a melhorar os indicadores sanitários e a diminuir as taxas de morbilidade e mortalidade das crianças e dos adolescentes, no arquipélago. Por cá ficarei 3 meses, mas serei apenas o primeiro de 5 médicos que, ao longo do ano, sempre num espírito de troca de experiências com os colegas santomenses, tentarão aplicar o know how adquirido no Hospital de São João, que se assume actualmente como uma unidade de referência, na saúde, em Portugal e no resto da Europa.

Este blog servirá para partilhar as minhas experiências diárias e vos dar conta da minha inserção nas novas rotinas, certamente muito diferentes daquelas a que estamos habituados no nosso país. Escrevo-vos, pela primeira vez, uma semana após a chegada a este paraíso tropical. E que semana! À chegada e logo rodeado por um calor húmido a que custa a adaptarmo-nos, a primeira impressão é que, aqui, a Mãe África brilha em todo o seu esplendor! A vegetação está por toda a parte e tudo cobre de um verde luxuriante, animado pelas cores intensas das flores. Ao fundo, contrasta, brilhante, o azul esverdeado do mar, calmo e recortado pelas silhuetas dos barcos dos pescadores. Pena é não ser poeta, para vos poder transmitir melhor o impacto de tanta beleza!

Poucas horas após a nossa chegada, sempre debaixo de um sol tórrido, demos início a uma série de reuniões, visando preparar o terreno para as nossas actividades, e que se estenderam por toda a semana e permitiram iniciar ligações pessoais que, em muitos casos, já ultrapassaram o domínio das relações profissionais, para se aproximarem da amizade, como no caso do Dr. Edgar Neves, Coordenador do Projecto "Saúde Para Todos", de que vos falarei noutro post.

Uma palavra muito especial de agradecimento às pessoas que me acompanharam nestas últimas semanas. Em primeiro lugar ao Sr. Presidente do Conselho de Administração do Hospital de São João, o Prof. António Ferreira, que, com a sua visão, nos impulsiona para atingir objectivos cada vez mais ambiciosos e nos permitirá aprimorar as relações com outros hospitais e outros povos. Ao Sr. Professor Filipe Basto, Director do Departamento de Relações Externas, pela sua delicadeza, humanidade e capacidade de mobilização, que tanto me ajudaram, sobretudo nos momentos em que o cansaço pareceu querer levar a melhor. Ao meu Director, o Sr. Prof. Caldas Afonso, pelo exemplo que sempre tem sido, ao longo deste caminho para me tornar Pediatra, e por me mostrar que nada é mais importante do que o bem das crianças. À Drª Diana Silva pela sua boa-disposição e energia, pelos bons conselhos que me tem dado e pela excelente companhia que tem sido. A todos, pela sua simpatia, por me terem ensinado tanto com a sua capacidade de trabalho e pela incansável preocupação com o meu bem-estar, um agradecimento sentido e um bem-haja.
Para terminar este primeiro post, não poderia deixar de agradecer à minha família, que sempre me rodeou de amor e me imprimiu uma vontade permanente de ajudar e de ser uma pessoa melhor, e também a todos os meus amigos, colegas e outros colaboradores que, nas últimas semanas, criaram uma onda de entusiasmo, à volta da minha vinda, que me ajudou a ultrapassar quaisquer dúvidas em participar neste projecto.
A todos MUITO OBRIGADO!

E agora, mãos à obra!